domingo, 21 de novembro de 2010

A fantástica criação do Dr. Gattaz

Há muitos anos atrás saiu uma matéria no jornal O POPULAR, de Goiânia - Goiás, sobre esse cientista brasileiro que revolucionou a informática mundial. Guardei o tal jornal (era um caderno que rodava na quarta-feira - específico de informática), mas infelizmente não o tenho mais. A matéria parecia mais completa, mas só encontrei essa - que ajuda a conhecer mais dos brasileiros CDF's.

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Por José Roberto de Alencar de Campinas

Cientista brasileiro cria sistema que se renova sempre, ao contrário dos softwares atuais

A boneca saía da caixa feito cuco e levantava a saia. O colégio vetou tal indecência na Feira de Ciências de 1967, em São José do Rio Preto, interior paulista. E Fuad Gattaz, inventor da sem-vergonhice (e da feira e do próprio clube que a promovia), bolou outra: a tábua de pregos. Centenas de pregos espetados em filas, uma sob a outra. O freguês que os ligasse na seqüência desejada - jogo de ligue-os-pontos sem numeração - e enxergasse o que bem entendesse. Inclusive safadezas. VIDA BRASILEIRA Fuad, 15 anos, papou o prêmio da feira: viagem a Paris. Sem saber, fizera um grafo, modelo matemático usado para representar, com nodos (pontos) ligados por arcos, cadeias de causas e efeitos que, por sua vez, causam novas conseqüências. Gostou desse negócio de grafo. E 17 anos depois, sua tese de doutorado, um grafo, boquiabria os 21 maiorais da computação mundial, reunidos na banca examinadora da Universidade de Maryland, EUA. Fuad enxergara (na tábua?) a chave do processo que revolucionaria a informática - já é usado por 300 companhias que respondem por um terço do PIB mundial. Exemplos? Fuji, Hitachi, Mitsui, IBM, Nippon e Matsushita, entre outras 79 empresas e órgãos oficiais no Japão; Westinghouse, Barclays Bank, Bank of America ou Philips na Inglaterra; Bell Sigma, Bell Telecom e McDonald no Canadá, Dassault na França ou Valmet na Finlândia; Daimler Benz Aerospace AG, Volkswagen AG, VW-Gedas, Siemens Nixdorf e Hewlett-Packard na Alemanha; Motorola, Merryl Linch, 3M, AT&T, Booz Allen, IBM, Citicorp, Boeing, Hewllet-Packard, Siemens, Lockheed, Salomon Brothers e Raytheon, entre outras 143 nos Estados Unidos. E em dezenas de empresas, universidades, centros de pesquisas e órgãos do governo também da Austrália, Grécia, Irlanda, Israel, Itália, Áustria, Cingapura, China, Suíça, México, Coréia, Bélgica... Nos EUA, além da nau empresarial e universitária, a tecnologia de Fuad está em projetos como Genoma Humano e Guerra nas Estrelas e em órgãos como CIA, Nasa, Army, Navy, Air Force, Departamento de Comércio e DoD, o de Defesa. Para este último, Fuad exorcizou o bug do milênio - matou a charada no ninho com a máquina contextual, seu invento hoje aplicado por 2 mil mestres, alunos de doutorado orientados por 200 cientistas, em dez centros de pesquisa espalhados pelo planeta. O inventor coordena tudo. A FANTÁSTICA CRIAÇÃO DO DR. GATTAZ José Roberto de Alencar de Campinas O truque de Fuad para espantar de jurado interiorano a bambambã da ciência mundial sempre foi a álgebra de grafes. Qualquer rede é grafo, seja de água ou telefônica, de esgoto ou neural, de pesca ou rodoviária. Tabela do campeonato é grafa Tábua de pregos. Imagine-se um organograma tomando um prego da primeira fila, seis da segunda, vinte da terceira... Uma mexidinha num nodo da segunda linha afetará seus subordinados da terceira, um ou outro colega da segunda e quem sabe, até o figurão da primeira. O ajuste de cada nodo afetado afetará novos nodos (inclusive o primeiro, de novo, recursivamente) e por aí vai. Fuad embasbacou a banca justamente pela percepção dessa sucessão de causas e efeitos que ramificam em novas causas de novos efeitos. Tinha feito Administração numa faculdade e Ciência da Computação em outra, ambas em Maryland. E só propôs uma tese, para os dois doutorados. A Universidade relutou em aceitar o atrevimento. Engoliu após pe perceber diante de algo grandioso, que em breve inscreveria Fuad Gattaz na história universal da Ciência da Computação, só atrás do indiano Rammamoorthy (inventor da pioneira calculadora HP e, aos 94 anos, ainda papa do pedaço), e do chinês Raymond Yeh, de 76, pai da engenharia de software. Aos quais, aliás, Fuad já era bem ligado. Papa e vice tinham adotado, fazia tempo, o bolsista brasileiro que um dia embocou pela sala de Yeh, em Maryland, cobrando, mais do que orientação para tese, uma tese para defender. Yeh contou a Fuad que manutenção encarece o software em 80% ao ano- a do segundo ano já custa 44% mais do que um novo. E que metade do capital investido no mundo é em software e, em cinco anos, 95% deles estão no lixo: a empresa pega um software para resolver uns problemas, ele entra em cena, resolve e muda a empresa, que vira outra, para a qual ele não serve mais: servia para a antiga. A ela resta pagar (80% ao ano) pela atualização. Ou comprar software novo - nova sucata all primo conto. Fuad gostou. Meteu-se na biblioteca e leu tudo sobre manutenção de navio, poste, usina de açúcar, piano, planta petroquímica, estrada, tudo. Saiu no terceiro dia com, o projeto da tese: uma fórmula algébrica. Yeh parou de rir da leitura estapafúrdia e, espantado, ligou para Rammamoorthy. Que cruzou o país à jato para ver de perto o projeto do pupilo de Yeh. Viu, impressionou-se - e requereu co-pupilaridade. Fuad descobrira que o gargalo do software sucateável estava em basear-se na máquina de. Turing, algoritmo bolado pelo inglês Turing (o matemático do século) para decodificar mensagens cifrados na Segunda Guerra. A Turing pára a realidade para analisá-la, e a mantém parada. Adequar o software à nova realidade pode exigir uma alteração na sua terceira ou quarta linha. Corrigir os efeitos dessa alteração pelo resto do programa equivale a refazê-lo inteiro. Esse foi o nó desatado por Fuad. Sua máquina contextual facilita ver os efeitos da mexida inicial nos nodos seguintes, e os efeitos dos efeitos. Em vez de refazer o programa, rastreia só a área afetável pela alteração. E o faz automaticamente: seu software gera um processo, incorpora as mudanças e gera novo software, que incorpora e gera... ao infinito. Congela a realidade, analisa, acha a solução mas não a dá por definitiva: trata-a como mero componente de novo software. Para quem manja o jargão, re-usa indefinidamente o output como input, para gerar novo outro condenado a input. Tábua de pregos compactada até virar um prego só, para ser fincado em nova tábua. Rammamoorthy e Raymond Yeh adotaram o pupilo certo - no que nem foram tão originais. Muita gente teve ganas de adotar o pestinha que aos 11 anos perdeu o pai de verdade, Feiez, em 1963. Em vez de ficar em casa ajudando os pequenos Feiez e Solange a azucrinarem Julieta, a mãe, Fuad preferia ajudar Alberto, o mais velho, na Charutaria Pilão-engraxates na porta, carteado no fundo - meça dos jogadores, boêmios e políticos da cidade, da vizinha Catanduva (a 66 quilômetros) e até da capital (a 450). A viveza do moleque encantava a letrada freguesia, até por nada ter de discreta. Já a brabeza e a sabideza exigiam certo estímulo. Chamá-lo de turquinho, por exemplo, era senha para destravar severa aula de História sobre os dominadores que, não contentes em infernizar o Oriente Médio, ainda tripudiavam o dominado desistente dando-lhe passaporte turco - razão pela qual sírios, libaneses, levantinos em geral desembarcavam turcos no Brasil. Na escola, o baderneiro de fundo de classe, sempre disposto a liderar tumulto, a bombardear banheiro e a pequenos banditismos em geral, era o eterno primeiro da classe. Cursou o Científico à noite e o Colégio de Química de manhã - a tarde era da charutaria. Vem dessa época a mania de embolar, fazer várias coisas em frações do tempo gasto por gente normal com cada coisa. E intercalava as coisas com brigas. A professora de Química o proibia de ir além da matéria do ano. Fuad desobedecia e, ameaçado, desafiou: Aposta que passo com 10?. No fim do ano, ela lhe deu parabéns e o Drurys perdido na aposta. Quebrou-o: não era fã de uísque. Já de Nilce, era. Conheceu-a na época e logo se casariam e teriam Cristiane, hoje bela estudante de 21 anos. De álgebra, lógico: o namoro dos pais foi algébrico. Em vez de frases melosas, Fuad escrevia fórmulas que, desenvolvidas, resultavam em frases ainda mais meladas. Ao contrario da mestra do Química, o de Matemática lhe dava linha. E ele voava, no científico, pelas alturas do Cálculo 3 - matéria de segundo ano superior. Em 1969, estagiário na Ultra-fértil, passou no vestibular do ITA. Não Foi. Ficar em São José dos Campos com só uma folga por mês? Nilce não aprovaria. O professor de álgebra do Anglo o aconselhou a fazer Física em Brasília com o professor Luís Carlos Gomes. Chegou tarde: Gomes já criava o primeiro curso de Informática do Brasil e o IBI, de Informática do IBGE - no Rio de Janeiro. Tudo bem, Fuad entrou na Física da UnB. Aproveitou para fazer também Eletrônica E Matemática: Cálculo 1, 2, 3 e 4 em apenas um semestre. Fácil para quem não tinha de dormir em casa. Aliás, nem casa tinha: passava as noites no laboratório da Física e na biblioteca. Se dava sono, dormia na bancada. Em dois anos, obteve todos os créditos de Física e Matemática. A UnB não o liberou: exigia quatro anos de cada curso. Ele que chiasse no Ministério da Educação. Preferiu perturbar o ministro, e Jarbas Passarinho mandou a UnB emitir os diplomas. Matriculou-se no mestrado de Informática da PUC, enquanto se graduava em Brasília. Em 15 meses, graduado, foi para o Rio. Chegou tarde de novo: em janeiro de 1974, o professor Carlos Gomes, aquele que ele perdera na UnB, já desenvolvia o Patinho, o primeiro computador brasileiro, rui USP, em São Paulo. No Rio, a PUC exigia um ano no mestrado. Aprontou tese (um grafo) em três meses. Um algoritmo para reconhecimento de clusters. Que diabo é isso? Algoritmo é um processo matemático para resolver problemas parecidos. Cluster é grupo de coisas parecidas. Se esse treco não fosse coisa de superior serventia, o software dele derivado não teria ajudado a USP no projeto do Patinho, nem a Embrapa o incorporaria a seu banco de algoritmos. A pressa da Embrapa foi, aliás, o mote para Fuad lhe pedir emprego. Em 1975, 22 anos e aquilo tudo de curso cursado, fascinou-se com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária: que pesquisava para matar a fome, essa coisa ruim. A burocracia exigia teste de QI. Recusou-se. Convenceu o presidente da Embrapa, Roberto Eliseu Alves, que gente reprovada nisso era melhor do que gente aprovada. Eliseu, outro dono de inteligência incomum, mandou contratá-lo. Dois meses depois, Nilce se demitia da escola em que lecionava, em Minas, e se mudava para o apartamento funcional cedido pela Embrapa a seu recém-marido, em Brasília Na Embrapa, Fuad estudava tudo - inclusive ela própria. Em 1979, ofereceu a Eliseu dois programas: um Sistema de Informação da Embrapa e o que batizou de Cain, Catalogação e Indexação Automática. Eliseu riu, mas desconfiou que a sigla não se limitasse à piada. Cabreiro, estudou e descobriu que o Cain simplesmente dispensava a diretoria toda da Embrapa. Inclusive ele próprio. Burro, Eliseu nunca foi. Ofereceu ao inventor uma bolsa de doutorado. Na universidade de sua preferência, mas no Exterior, bem longe. E bem demorada. Fuad escolheu Maryland. Chegou ainda em 1979 e procurou Yeh pedindo tese para defender. Ali começou a roda viva, a vida entre o papa e o vice-papa, e Sol Gass (pioneiro da pesquisa operacional). Edgard Sibley (o do banco de dados e que conhecia o Cain), Nick Roussopolos, David Parnas, Harlan Mills (que informatizou o texto e editoração do Wall Street Journal), Peter Ng e o biólogo, economista, físico e matemático Herbert Simon, prêmio Nobel, pai da inteligência artificial. Mal entrou no gabinete de Yeh, na universidade, para mergulhar na tese, Fuad percebeu um enrosco: passar idéias do computador para o papel exigiria impressoras diversas. Viu que programa gerado num computador IBM ou Univac rodava de um jeito na máquina Univac e de outro na IBM. O imbróglio estava nos protocolos de comunicação, especialmente entre software e máquina. A plataforma (o computador) só entendia seu próprio sistema operacional. Isso impossibilitava o chamado re-uso. Como enfiar um programinha em Fortran, por exemplo, debaixo de outro em PL/1? A solução implicava mudar alguma coisinha num ou noutro - e lá estava, de novo, justamente o tema da sua tese. Mexer num só dado de um software de 2000 linhas exige a análise de 2 elevado a 2000 efeitos possíveis. Programa de 1 milhão de linhas exige a observação de 2 elevado a um milhão de possíveis conseqüências. Rammamoorthy bolara um algoritmo para verificar efeitos da mexida num componente de hardware na arquitetura daquele hardware. Para software, não servia, pois os efeitos da mexida num elemento variavam conforme a máquina. A cascata de conseqüências verificada ao rodar o software nunca era a mesma em máquinas diferentes. E esse era um outro problema que Fuad, com a mania crônica de fazer tudo a um só tempo, embolou. Se a análise da cascata inteira era impossível, o jeito era perseguir só os nodos realmente afetáveis a partir da primeira mudança. Viu-se, então, diante de um clássico da álgebra: o Problema do Caixeiro Viajante. Ao caixeiro cabe descobrir o caminho mais rápido, mais lucrativo, melhor e, enfim, mais inteligente. Problema exponencial. Fatiá-lo em classes (clusters) de complexidades facilita sua compreensão e pode até levar à solução. No caso do software, levou. Partindo do algoritmo de Rammamoorthy e da máquina de Turing, Fuad chegou ao que chamou de Software Maintenance Management Model, o algoritmo de slicing e tracing, que fatia o programa todo catando efeitos na frente e atrás. Naquele mesmo ano de 1979, no qual faturou a bolsa anti-Cain para Maryland, seu algoritmo de slicing e tracing estava pronto. Daí a gerar uma estrutura foi um pulo. Pegou um comando (abrir arquivo, excluir ou copiar, por exemplo) e o representou graficamente em três dimensões. Quebrando todos os comandos nesses três elementos gráficos, podia representar o programa todo num grafo do tipo e/ou. Para gáudio do caixeiro. Em 1982, a Defesa americana abria licitação para definir um padrão Cobol (o Ansi variava muito, de máquina para máquina), e Fuad entrou. Mas em vez do padrão pedido, desenhou uma máquina de estados capaz de gerar com piladores. Para rodar um programa Cobol bastava usar esse compilador, qualquer que fosse o computador. Esse gerador de interfaces ganhou o nome de Galaxy. Com ele, Fuad acabou com a desinteligência dos protocolos de comunicação. O homem conversa com a máquina em qualquer língua, o software se entende muito bem com a plataforma independentemente do sistema operacional, não interessa mais em qual máquina foi feito o software, tampouco-a linguagem de programação. Fuad podia, agora, voltar à manutenção. Se ficara fácil para o caixeiro se ater à área afetável pela primei-ra mexida, por que não mexer à toda hora? Por que esperar a emprega mudar para só então fazer a manutenção? Duas novas tecnologias sairiam da cabeça do inventor: uma batizada de Proto e outra de Fun. Fun é um simulador dos desejos: freguês bota no computador o mapa da cidade, dados do trânsito, locais onde tem radar e pergunta qual o melhor arminho no seu horário para ir para o trabalho. O Fun simula bilhões de possibilidades e lhe dá relatório das melhores opções. Ao experimentá-las na realidade, o freguês descobrirá o buraco, a fita dupla na porta do restaurante, o guarda, escondido, o sinal engripado e outras diferenças entre o sonhado e o real. BRASIL RECUPERA O TRUNFO DE TIO SAM Em, 1984, o adido militar do Brasil nos EUA mexeu com a cabeça de Fuad Gattaz. O coronel Gleuber Vieira - que montou o serviço educacional do Exército e hoje é o comandante-chefe - lembrou-o de que não teria ido tão longe sem as bolsas pagas pelo contribuinte brasileiro. E cobrou retribuição: Mais do que Tio Sam, o Brasil precisava dele, na Secretaria Especial da Informática (SEI, do Conselho de Segurança Nacional). Fuad deu-lhe razão - não tinha pensado nisso. Àquela altura, os centros de pesquisa orientados por Raymond Yeh e Rammamoorthy aplicavam o processo de Fuad ao redor do mundo, desenvolvendo e fornecendo fábricas de fábricas de software para os vários domínios da atividade humana: ramo da indústria, rede elétrica ou telefônica, setor do governo, um negócio qualquer - como na tábua de pregos, está tudo lá, basta escolher a área de interesse e desenhar com os pregos adequados a cada domínio. Como a cria andava sozinha, o criador podia sim criar um centro de pesquisa no Brasil e daqui coordenar o trabalho no mundo. Veio. Não quis atar seu centro direta-mente à academia: a burocracia da universidade estorvaria muito. Retomou à Embrapa, que fez convênio com a SEI para botar uma fábrica de software no Centro Tecnológico para a Informática, CT1, de Campinas. Rodou o Brasil com Mário Ferraretto atrás de parcerias. Nenhum centro de pesquisa ou universidade aderiu. Assim, contava com magros US$ 500 mil orçamentários - um nada perto dos US$ 150 milhões anuais destinados, por exemplo, às pesquisas de uma Microeletronic Computer Corporation. No início de 1985, SEI, Embratel, Serpro e Embrapa patrocinaram o I Workshop de Fábrica de Softwares. Aplausos não faltaram. Dinheiro, que é bom, só os US$ 400 mil da Fundação Banco do Brasil para o Núcleo Tecnológico de Informática Agropecuária da Embrapa. Em 1989, workshop internacional avaliou o projeto. De novo, muita palma, mas nada de grana. Fernando Collor tomou posse na Presidência da República e nomeou Fuad diretor técnico da Embrapa. Agora a coisa ia, não é? Não. Depressinha, o diretor se demitiu da indigente diretoria técnica para reassumir o Núcleo da Embrapa no CTI. Uma CPI do Congresso (Comissão Mista Parlamentar de Inquérito), sobre o atraso tecnológico do Brasil, presidida pelo senador Mário Covas e relatada pela deputada Irma Passoni, decidiu recomendar a criação de um Instituto Internacional de Integração de Sistemas. E Fuad criou. Era 1992. Quase ao mesmo tempo, registrou uma empresa nos EUA, a Ambiente de Gestão de Inteligência da Realidade (Agir), para receber os direitos autorais dos três programas - Galaxy, Proto e Fun. E do IIIS (o instituto, sem fins lucrativos), passou a coordenar tanto o projeto da Fábrica de Software Paulista quanto o de Segurança Alimentar da Embrapa com secretaria paulista de Ciência e Tecnologia. Só não apareceu dinheiro: os sábios da Fundação de Amparo à Pesquisa (Fapesp) estudaram, não entenderam bulhufas - e vetaram. Ambos os projetos sobreviveram a duras penas até agosto de 1994. Aí, a Conferência Internacional de Integração de Sistemas reuniu em São Paulo 450 estrangeiros e 450 brasileiros. Irma Passoni levou estrangeiros para avaliar, nas favelas, o Projeto de Segurança Alimentar - e o quanto a tecnologia de Fuad podia fazer pela cidadania. O presidente da Agroceres, Ney Bittencourt, propôs ao presidente da República, Itamar Franco, uma parceria pela Segurança Alimentar. Disse-lhe que um país só faz sentido se tiver povo, e o povo, para existir, precisa comer - o resto é firula. Ney entraria com o trabalho na linha produtiva, Irma na área social, Fuad com a tecnologia e Itamar criaria o Conselho. Nacional de Segurança Alimentar, composto por onze ministros, Embrapa, Betinho e outros representantes da sociedade civil. Além de criar o Conselho, Itamar mandou a Finep Financiar o Mapa da Fome. Pena que a Finep, como a Fapesp, não entendeu que era tudo a mesma coisa e proibiu o Conselho de desviar recursos para a fábrica de software. Para Fuad, tudo bem. USP e ITA aplicavam sua tecnologia no Brasife New Jersey University nos Estados Unidos e um ramalhete de universidades e centros de pesquisas da A\t\ manha, Áustria, China e Japão espalhavam sua aplicação pelo mundo No Brasil, A AS&D, uma empresa privada, bancou sozinha toda a apuração da fábrica, até 1996, ano do primeiro negócio. Com a Telesp. Fuad chegou a ter saudades dos Estados Unidos. Lá, o DoD financiava até o Eureka, europeu, com uns US$ 100 milhões por ano. Aqui o primeiro dinheiro mais grosso to entrar - US$ 3 milhões da Telesp - provinha da venda de ano e meio de serviço, na montagem de uma fábrica de software orientada para o domínio de comunicações. Em 1997, sua tecnologia ganhou na Comdex Internacional (Austin, Texas), o Prêmio da Unicidade da Tecnologia da Sociedade paia a Ciência de Desenhos-e Processos, pelo primeiro (e ainda único) processo de fábrica de software baseado em tecnologia que gera processos para, outros domínios. Fuad havia saído um ano antes da Embrapa para cuidar da Fábrica de Software (no prédio do Cati, em Campinas) e dar aulas na Politécnica,no convite do coordenador do Laboratório, de Sistemas Integráveis, o professor João Antonio Zuffo. Em tempo: Fuad chegou tarde outra vez: o professor Luís Carlos Gomes, já se aposentara. Jamais se viram. (J.R.A) FALTA DE RECURSOS AINDA PROVOCA MUITO DESPERDÍCIO De 1994 a abril de 1998, Júlio Semeghini foi presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo (Prodesp). O desafio era desenvolver ferramentas que pudessem sistematizar a gestão pública: com corte de sustos e desperdícios. Integrar as diversas informações espalhadas com várias tecnologias em inúmeros pontos da administração com o máximo de transparência. Em 1997, o Instituto Internacional de Integração de Sistemas (IDS) - a turma do cientista Fuad Gattaz - fez uma apresentação para o governador Mário Covas e seus secretários sobre o Ambiente de Gestão da Inteligência da Realidade (Agir). Semeghini recebeu a incumbência de ir atrás dos projetos. O primeiro passo foi enviar três técnicos da Prodesp, atuantes na Secretaria da Saúde, para o instituto em Campinas. O objetivo: coletar dados para elaborar um sistema de controle epidemiológico. Os inventos do professor Fuad permitiriam a conversa entre os vários hospitais com linguagens completa-mente diferentes. Mas o máximo deixado pelos funcionários da Prodesp foram informações. O próprio pessoal do BIS acabou dando seqüência ao trabalho. Foi feita a modelagem para saber como seria o desenvolvimento do processo de gestão para vigilância da saúde. O instrumental tecnológico renderia ao governo informações em tempo real sobre as doenças endêmicas e epidêmicas. De quebra: soluções. Mas as principais qualidades do sistema ficaram na saudade. A integração e a possibilidade de visualização do fluxo de todas as etapas do processo não foram para frente. Semeghini, lembra: os testes foram feitos em época pré-eleito-ral, mudança de governo e falta de recursos. O anteprojeto custaria quase R$ 3 milhões na implementação. O desperdício continuaria por falta de recursos. O governador Mário Covas, que já tinha se maravilhado com as idéias de Fuad, quando ainda era senador e presidente da CPI do atraso tecnológico em 1992, foi reeleito. O presidente da Prodesp não continuou na antiga função. Virou deputado. Hoje na estatal, a tecnologia do Agir é língua estrangeira. Semeghini ainda elogia as maravilhas do sistema. A ajuda que pode dar agora é como relator do projeto da Lei de Informática. Aprovada a prorrogação do incentivo fiscal para investidores em pesquisa tecnológica, já será uma mãozinha para Fuad e tantos outros cientistas. (A.H) INVENÇÃO PROMETE SER NOVA VEDETE Andréa Háfez - de São Paulo Tecnologia testada dá respostas rápidas às mudanças e interessa do Legislativo ao Exército No Legislativo, na academia, nas empresas e até no Exército. Interesse pelo invento de Fuad Gattaz não falta. E, se é complicado explicar no papel a tal tecnologia do Ambiente de Gestão da Inteligência da Realidade (Agir), quem testemunhou sua execução achou tudo simples, maravilhoso e transparente. É assim com o pessoal do Senado. Num antigo depósito reformado está o Laboratório Vivo do Legislativo (LVL, também apelidado de fábrica de software). As idéias de Gattaz chegaram lá em 1997. No começo de 1998, chegaram os computadores e a equipe de engenheiros preparados em Campinas. Mas a matéria-prima fundamental já estava em Brasília: as idéias dos servidores. O primeiro setor a experimentar da nova tecnologia foi o de pessoal. Otimizar os recursos humanos e reduzir custos no Senado eram objetivo da criação do novo processo de gestão de pessoal. Os benefícios devem atingir mais de 3 mil servidores, trinta dos quais participaram da construção do processo. Os velhos sistemas, além de cada vez mais distantes da realidade, não davam respostas rápidas às mudanças. No setor público, leis que modificam as regras de trabalho não faltam. Eram dois, três meses para aparecerem os reflexos de qualquer alteração, pois não havia um desmembramento das funções que permitisse mexer no ponto certo e ao mesmo tempo integrar a nova informação ao processo. Até que chegou o brinquedo de monta-desmonta de Fuad. O interesse cresce com a participação de mais pessoas. Os trinta primeiros fizeram um streap-tease do modelo atual, com as atribuições regulares, a estrutura e as referências legais. Depois propuseram sua imagem de uma Visão Futura. É a abstração que as ferramentas de Fuad vai transformar num sistema, cruzando o real com o ideal para gerar opções de solução. Não é só um controle informatizado do fluxo-grama como o do Workflow. É o processo todo informatizado e com memória. Se amanhã mudarem os funcionários, qualquer pessoa pode retomar o processo com tudo documentado eletronicamente, diz o diretor da Subsecretária de Pessoal do Senado, João Carlos Zoghbi. Só dá trabalho o começo: o detalhamento das rotinas. Para Ivar Alves Ferreira, diretor do LVL, é uma volta ao tempo em que a informática se resumia a computadores grandões retratando a realidade de cada usuário. Depois, para popularizar, programas e aplicativos foram padronizados para os PCs. A realidade que se adaptasse às ferramentas disponíveis. Sem pressa, hoje retomamos a especificação de cada um. O objetivo é olhar o serviço da origem ao final, conectando todos os segmentos, mas agora com uma ferramenta informática. Antes era o pessoal de Organização e Metodologia, que fazia na mão as mudanças de acordo com as necessidades. Segundo Ivar, O trabalho inicial é compensado pelo resultado: o sistema que acompanhará a realidade, alterando o que interessa sem prejudicar o todo. E sem novos custos. A estrutura do LVL inclui 12 técnicos na modelagem, sete na programação, 20 estações SUN com sistema operacional Unix e vinte microcomputadores. O Exército, sob o comando do General Gleuber Vieira, também analisa o uso dos inventos do cientista. Nesta semana alguns oficiais visitam o Instituto Internacional de Integração de Sistemas (MS), para conhecer as ferramentas do Agir para processos de gestão. A tecnologia de Fuad também emociona a comunidade acadêmica. Parceria do IIIS, do qual Fuad faz parte, com a USP e outras instituições públicas e privadas, pretende criar o Programa de Integração de Sistema de Informação (Proisi), projeto já acolhido por empresas como NEC e Motorola. Na linha de frente, o titular de eletrônica da Politécnica e coordenador geral do Laboratório de Sistemas Integráveis da Politécnica, prof. João Antonio Zuffo. Fuad resolveu o nó da sistematização da criação de softwares, diz Zuffo. E reforça com dados: a microeletrônica expande em 45% o numero de componentes a cada ano e meio; as telecomunicações, em 78% ao ano; já a capacidade de processamento cresce mil vezes por década. A geração de software avança apenas 4% ao ano. Daí a importância do gerador de softwares de Fuad, que se aplica em qualquer setor. O Proisi ganha fôlego. O intoesse de empresas como Motorola Internacional se traduz em cifrão: US$ 1,5 milhão (em 30 toneladas de equipamentos) já chegou e até o fim do ano 2000 bate em US$ 20 milhões. Mas faltam verbas para a construção do prédio e a infra: algo como US$ 22 milhões. Só melhora com a aprovação da nova Lei de Informática, diz Zuffo. Se aprovada, ela prorrogará os incentivos fiscais para os investidores. Para Carlos Augusto Carvalho, presidente da Fundação Casimiro Monte-negro Filho (complementadora de projetos do ITA), empresa brasileira não investe em tecnologia, mas precisa das inovações. A de Fuad é fundamental, sua manutenção gera novos aplicativos: As velhas tecnologias são pacotes. A REVANCHE DOS PROFETAS DO CONTEXTO Álgebra de Gattaz faz oposição aos programas de computador voltados ao objeto Mario de Almeida - de São Paulo A conquista tecnológica capturada pelo dr. Fuad Gattaz se apóia num triunfo pessoal desse pesquisador hiperdotado em campo árido e muito freqüentado, a matemática pura. Mais precisamente, desde que labutava no doutoramento, em Mariland, vinte anos atrás, ele se atirou junto com os professores o um exército mundial pequeno, ainda que brilhante, de universitários irredutíveis, ao desafio de guardar os princípios então aparentemente destroçados de uma abordagem oposta ao que pregavam os vencedores da programação voltada ao objeto na ciência da computação. A base científica do trabalho de Gattaz expressa uma revanche desse grupo genuinamente globalizado, cujos adeptos figuram nos quadros de professores das melhores universidades mas ainda têm escassa visibilidade pública. Posto em termos acessíveis, o fulcro desse embate acadêmico não parece articulado com a vida real, fato bastante comum na interface da pesquisa avançada com a vida cotidiana. Percorrê-lo, contudo, é vital para que se possa alcançar a magnitude do que o brasileirinho de São José do Rio Preto colocou de pé. Os programas de computador orientados ao objeto dominam completamente o mercado mundial. Seu princípio é apresentar a solucionática do problema na tela, em forma de ícones singelos e compreensíveis, sem mostrar nenhum detalhe daquilo que o antigo goleador Dano chamava de problemática. Exemplo glorioso dessa modalidade é o Windows. Mas todos os ERPs, os Entreprise Resourse Planning, sistemas para gestão empresarial que dominaram o mundo dos negócios na década de 90, também seguem o modelo. Todos os recursos de processamento ficam embutidos no software, o que facilita a existência de leigos mas torna cada operação numa definitiva caixa preta lógica. Essa técnica 6 legítima e se baseia nos princípios da álgebra até então conhecidos e aceitos. Ou seja, axiomas e funções se articulam independente do contexto em que a relação se processa. Segunda ou Terça, dia limpo ou chuvoso, o resultado do processamento é sempre igual. Ocorre que o mundo contemporâneo relativiza todas as coisas. Em especial, desde que a Guerra Fria acabou. Três milênios de História foram sepultados nos últimos dez anos, pois todo ser humano era treinado a reagir instintivamente a cada problema dentro do figurino do golpe principal, achado do pensamento chinês ancestral que servia no começo para definir a solução de problemas estratégicos da guerra, mas que depois passou a figurar em todas as ações de um ser humano. Agora, tudo é contexto. Até a velha álgebra. E quem realizou a façanha de transpor a barreira matemática pelo uso inteligente das ferramentas da moderna ciência da computação foi o dr. Gattaz. A gênese do seu pensamento surgiu em 1979, no tema proposto ao candidato a doutor pelo já então lendário professor Raymond Yeh, já então um dos líderes da corrente minoritária, que insistia em tratar cada problema na tecnologia da informação como um verdadeiro teorema, que devia ser compreendido e dominado para que a solução surgisse na cabeça do usuário, mesmo que esse não fosse especialista em alta matemática. Consistia no estudo dos efeitos colaterais de alguma correção aplicada por exemplo numa das milhares de linhas de código que compunham um programa de computador. Essa operação de rotina tem sido aplicada nos dias que correm para corrigir a conhecida limitação no campo reservado a datas em programas confeccionados há mais de vinte anos - e que deram origem ao temido bug do milênio. Em sistemas complexos, que articulam milhares de programas distintos, cada interferência desse tipo gera potencialmente uma quantidade exponencial de interferências. Gattaz criou um método para estimar e, depois, determinar a propagação desses efeitos. Ganhou o grau com louvor e também abriu a porta de uma preocupação que veio a consagrá-lo. O ponto de partida dessa aventura foi a escolha do método para enfrentar o problema. O aluno do prof. Yeh não tinha escolha senão andar pelo rigor da matemática. E começou pela tarefa mais difícil: repartir o seu desafio em partes menores, criando assim uma espécie de árvore de reflexões. Ou seja, começou a construir um teorema na melhor tradição do ramo. E desde então ele só tem feito isso com todos os problemas que enfrenta. Seus discípulos também, formando uma escola que ainda mantém ligações com Yeh, hoje no Texas. O resultado presente dessa trajetória é um conjunto de sistemas cujo produto só dá certo se e somente se o usuário reparte corretamente o seu problema em conjuntos menores, todos ordenados segundo o mesmo princípio lógico. A prática aperfeiçoada nas duas décadas e o uso do material disponível em todo computador, sobretudo os recursos gráficos, tornam esse exercício familiar a quem domine um programa simples da Microsoft. Mas a etapa lógica é indispensável. A pessoa tem de conhecer, fatiar, esmiuçar o seu problema, até colocá-lo numa forma em que cada uma das etapas que comparecem e interferem na sua execução fiquem explícitas, na posição em que comparecem na realidade. Quem acompanhou esta explicação até aqui sabe que a maneira exposta para atacar um desafio lógico chama-se simulação. Gattaz construiu a seqüência de ataque que permite simular, mas fê-lo com algo a mais: a interligação de cada uma das causas e de seus efeitos permite determinar a cadeia de interferências, tanto as antecedentes como as conseqüentes, facilitando as incontáveis alterações que uma abordagem dessa espécie impõe. Na álgebra de Gattaz e discípulos, um ajuste de situação é instantaneamente adotado pelo todo, re-combinando assim todos os fatores em tempo real para oferecer uma solução adaptada ao novo contexto. E isso sem levar em conta o tipo de computador em que a operação está sendo executada. Ele traduziu em tecnologia uma das forças da matemática, que se expressa na possibilidade de replicar uma situação lógica infinitamente, desde que esteja sua construção correta, apresentado-a sob roupagens diversas pelo uso de ferramentas de representação construídas até mesmo para outras aplicações. Nessa abordagem, um ponto luminoso identificado na tela de um computador é tratado da mesma forma que uma adição. São problemas cuja expressão em forma algébrica permite tratá-los como se fossem gêmeos idênticos, sem levar em conta o particular processador encarregado de tratar aquelas funções. Aliás, as duas podem ser levadas a um terceiro computador e apresentadas depois na tela de um quarto espécime. O que facilita enormemente simulações complexas. A técnica de Gattaz deriva da similaridade dos problemas que a ciência enfrenta. Estudar o código embutido no DNA de uma forma de vida apresenta a mesma complexidade do que a solução de um problema de computador como tratado aqui. A questão, sempre, consiste em tomar um desafio que soa como infinito no primeiro momento, reparti-lo em pedaços lógicos e representar o novo conjunto de forma compreensível, que possa ser trabalhada mediante restrições que permitam o estudo em pequena escala. Para computar, Gattaz classificou as restrições em quatro tipos: um assinalamento, um desvio, uma condição ou um intervalo de tempo. Com essas possibilidades de intervenção - e só com elas - ele cobre toda a gama de necessidades para quem pretende simular uma situação em qualquer gomo elementar nos quais se divide um problema. Um elemento de lógica aqui significa algo que os matemáticos chamam de autômata: um estado inicial, axiomas que determinais o grau de liberdade com que as restrições podem ser exercidas, as funções de transformação e os estados finais. Imagine-se por exemplo que um consultor de empresa esteja observando certa linha de produção. Determinada cortadeira produz cinco unidades por minuto quando operada por uma pessoa: Como tem dois lados, poderia dobrar a rentabilidade se outro indivíduo atuasse no outro lado do corredor. Mas ela não poderia acolher um terceiro indivíduo, por falta absoluta de condições físicas. Aí está uma situação inicial, uma função de transformação, uma restrição axiomática e um estado final, que pode ser a coleta de 5 unidades/minuto ou até 10 unidades/minuto se os dois indivíduos tiverem preparos equivalentes. Essa hipotética linha de produção poderia ser representada integralmente na forma de autômatas, que se integrariam em seqüência permitindo um estudo acurado das condições daquela linha, seus gargalos, possibilidades de aceleração etc. Num caso assim singelo, basta o cérebro experiente do consultor, para resolver o problema. Alguma simulação apressaria a resposta, mas raramente ofereceria alguma solução inusitada. Mas se o problema de interferências simultâneas for gigantesco, como aconteceu durante a recente operação militar na Sérvia, os recursos da álgebra contextualizada fazem uma diferença brutal. Aviões super ou subsônicos, foguetes de curto ou longo alcance, navios, tudo agindo, em conjunto, mas cada ação controlada individualmente por algum centro operacional remoto, que por sua vez dependiam do controle estratégico unificado do Pentágono. Esse caso real, que mobilizou atenções no semestre passado, representou a maior aplicação prática até hoje da técnica de Fuad Gattaz para estudar e resolver um problema levando em conta todas as interferências possíveis em tempo real. Um triunfo militar sobre força aguerrida, que custou dois aviões e nenhuma vida no lado da aliança atlântica. A consagração de uma certa maneira de pensar matemática; que parecia enterrada duas décadas atrás e foi restaurada pelo discreto; pesquisador brasileiro. QUANDO O DESTINO DA INTELIGÊNCIA FOI O LIXO José Roberto de Alencar - de São Paulo A China é bom exemplo do mau negócio que é jogar inteligência fora.. Os chineses rejeitaram, não usaram e finalmente esqueceram as tecnologias que lhes dariam o domínio mundial, conta Lester C. Thurow, em Building Wealth, inédito no Brasil. Thurow lembra que a China tinha no século XI todas as tecnologias necessárias para a revolução industrial, que só se daria dali 350 anos. Tinha o aço (sua produção não seria igualada em 700 anos), carvão e pólvora. Explorava gás e dominava o sistema decimal, os números negativos e o zero. É. A China fazia belo papel no século XI. E imprimia nele com tipos móveis - ignorava que Johann Gutenberg só inventaria a imprensa em 1450. Produzia de macarrão a bússolas. O infante d Henrique nem sonhava com a Escola de Sagres, que criaria em 1415, e os chineses já fadam navios de 120 metros de comprimento, 1300 toneladas. A frota dos Ming exibia 250 navios de longo curso; a armada, 1.350 de guerra e 400 fortalezas flutuantes. Era um império condenado desde 1386, quando Chu Yuan-tchang espaventou a cambadinha de mongóis incrustada no poder 171 anos antes pelo siberiano Gengis Khan, arrumou um nome mais curtinho, Hong Wu, virou imperador, deu por fundada a Dinastia Ming - e caiu de pau na tecnologia. Os Ming eram da paz e das cousas do espírito. Deve-se ao nojo que tinham à- tecnologia o destaque obtido pela China no livro Ascensão e Queda das Grandes Potências, de Paul Kennedy (Ed Campos). Que queda! Em 1557, portugueses tomaram Macau; em 1644, mandchus derrubaram os Ming; e em 1841, ingleses impuseram aos chineses os tratamentos desiguais, antítese do sonhado espiritualismo dos Ming. O Brasil não corre o risco de abdicar da tecnologia materialista (e da soberania e da independência) em troca de paz e bobeiras espirituais. Tem afeição desembestada pelo consumo e nenhuma paz ameaça seu futuro: as ruas e roças da pátria da renda concentrada vivem à beira do curto-circuito - diagnóstico do general Cardoso, da Casa Militar. O Brasil abre mão da tecnologia (e do resto) por muito menos. Um golaço aqui, um troféu ou medalhinha ali, um elogio estrangeiro à musicalidade de sua gente e pronto: a Nação de chuteiras se dá por feliz, coberta de borbulhas cívicas. O orgulho nacional dispensa gênios - e não é de hoje. Máquina de escrever; de quem é? Do inglês Henry MUI dono de patente concedida no século XVlll peia rainha Anne. Ou do americano Sholes, que em 1867 montou e vendeu uma para a Remington. O padre Francisco de Azevedo, paraibano que seis anos antes exibia seu protótipo inclusive para d. Pedro II, ganhou medalhinha de ouro na exposição do Rio, em 1861. Aviação? óbvio que o Passarola - com o qual o padre Bartolomeu de Gusmão voou a 8 de agosto de 1709 para d. João VI ver - não vale. Não era avião. Era só o primeiro balão tripulado. A mesma razão tira do páreo o patenteado pelo paulista Gastão Madeira; o do mineiro Leopoldo Corria da Silva registrado também em 1890 na Alemanha; o do paraense Júlio César de Souza; o patenteado até em S. Petersburgo por Carlos Rostaing; o do jornalista abolicionista José do Patrocínio; e o Pax, com o qual o potiguar Augusto Maranhão se estatelou em maio de 1902 na Avenue du Maine. Tudo balão. O paraibano Marcos Barbosa voou com asas de pau e tela antes de 1894, data do registro do planador do alemão Otto Lilienthal; o Jaburu Voador foi registrado em 1899 por Paulino Num; Santos Dumont rodeou a Torre Eiffel em 1901 num dirigível e repetiu a façanha no 14-Bis em 1906, no primeiro motorizado oficialmente observado. Mas os norte-americanos gostam mais do teto e cambaleante voozinho de 12 segundos de Wilbur e Orville Wright, mal testemunhado em 1903, na Carotim do Sorte, Um grande jornal brasileiro, ao listar as conquistas do milênio, também cedeu a aviação aos Wright E ao listar os 450 mais brilhantes cientistas brasileiros esqueceu de Fuad, que no seu próprio auditório denunciou a suspeita compra do Projeto Sivam da Raytheon - mero pedaço, baratinha, do Galaxy de Fuad. Padre Landell fez a primeira transmissão da voz humana do mundo, sem fio (pela irradiação de onda eletromagnética), entre o espigão da Paulista e Santana, distante 8 quilômetros, em 3 de junho de 1900. A 9 de março de 1901, pegou patente no Brasil do aparelho de transmissão phonética à distância, com fio ou sem fio, através do espaço, da terra e do demento aquoso. Em outubro de 1904, saiu a patente americana 771.917, para seu transmissor de ondas (rádio). Em novembro, saíram as do seu telefone sem fio (775337) e telégrafo sem fio (775.846). Existiam o telégrafo de Samuel Morse de 1837, o telefone de Graham Bell de 1876 e a radiotelegrafia de Guglielmo Marconi de 1896. Mas os dois primeiros usavam fio e o terceiro, sem, só transmitiu ruídos em código Morse. Isso, dois anos depois de Landell transmitir voz sem fio. Enquanto esperava pelas patentes, em Washington, Landell descreveu, em agosto de 1904, o telephotorama - visão à distância A primeira televisão só apareceria a 22 anos. Há indícios de que, na virada do século, Landell tenha idealizado o teletipo e o controle remoto por rádio, só inventados na Primeira Grande Guerra e em 1928. Ah, sim: Fuad Gattaz mora em Campinas.